Comitê de Política Monetária (Copom) subiu a taxa básica brasileira em 0,25 ponto percentual, para 10,75% ao ano. Compras com cartão de crédito.
Divulgação/Secretaria da Economia
A nova alta da taxa básica de juros (Selic), determinada nesta quarta-feira (18) pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central do Brasil (BC), deve trazer novos impactos para o mercado de crédito e para a economia.
Segundo especialistas consultados pelo g1, a leitura é que o aumento de 0,25 ponto percentual (p.p.) da Selic pode tanto encarecer o custo de empréstimos para os consumidores, como diversos reflexos na economia ao longo dos próximos meses.
O aumento da taxa básica já era amplamente esperado pelo mercado — e a expectativa é que novas altas da Selic ainda devem vir à frente.
Além dos bons resultados de crescimento econômico que o país vem colhendo nos últimos meses, a falta de soluções para as contas públicas e a dificuldade em atrair investimentos para o país também ajudavam a impulsionar as expectativas de inflação para cima, e pressionaram o BC a tomar alguma atitude em relação aos juros.
Entenda nesta reportagem quais os efeitos da nova alta de juros e o que esperar à frente.
LEIA MAIS
Copom aumenta Selic pela primeira vez no governo Lula e taxa vai a 10,75%
Fed corta juros dos EUA em 0,50 ponto percentual, para 4,75% a 5% ao ano
Superquarta: entenda por que o BC do Brasil vai subir os juros, enquanto os EUA vão baixar
Por que a nova alta de juros pode impactar a economia?
A taxa básica de juros do país é o principal instrumento utilizado pelo BC para controlar a inflação. Além disso, a Selic é uma taxa de referência que ajuda a determinar os demais juros do país, como taxas de empréstimos e de aplicações financeiras.
Quando os juros de um país sobem, o custo de dívida das empresas e dos cidadãos também aumenta. Isso encarece os investimentos por parte das companhias e reduz o consumo das famílias. É um controle dos preços por meio da desaceleração da economia.
No mercado financeiro, uma Selic mais alta significa aumento da rentabilidade da renda fixa. Os títulos do Tesouro, por exemplo, fazem parte da dívida pública, o que gera piora das contas do governo. Há também uma maior atratividade para CDBs, LCIs e outras aplicações do tipo, já que a Selic serve de referência para os títulos privados.
Na renda variável, o maior custo de dívida das empresas pode influenciar a forma como investidores calculam o que seria o valor justo das ações das companhias listadas, diminuindo o apetite pela bolsa de valores.
De acordo com o economista e professor da Saint Paul Escola de Negócios Maurício Godoi, há dois cenários principais para explicar esse aumento da Selic.
“O primeiro é a falta de disciplina fiscal do governo, que tem tido dificuldade em controlar os gastos públicos. E o segundo é a política monetária, que é responsável por conduzir a velocidade das transações dentro da economia. Com essa alta, esperamos uma retração de produção e consumo”, disse.
Como isso deve ser sentido pelos consumidores?
Segundo especialistas consultados pelo g1, o principal impacto a ser sentido pelos consumidores deve ser no encarecimento do crédito.
“Com a Selic maior, os bancos vão emprestar dinheiro por uma taxa um pouco mais alta. Outro ponto é que as prestações do crediário, da compra de imóveis novos e de bens duráveis, por exemplo, também devem ficar mais caras”, explicou o professor de finanças da Faculdade Fipecafi Rogério Paulucci Mauad.
Além disso, os especialistas também sinalizam um possível aumento da inadimplência.
Isso porque esse encarecimento do crédito a partir da elevação da Selic acontece em um cenário de juros já altos e de um endividamento já elevado no país. Segundo o BC, o endividamento total das famílias ficou em 47,6% em junho de 2024.
De um lado, a nova alta da Selic contribui para segurar o mercado de crédito, impedindo que famílias peguem crédito em um momento de juros altos e ajudando a controlar o consumo e a inflação. Mas, de outro, aqueles consumidores que já estão endividados podem ter dificuldade em honrar seus compromissos, que vão ficar ainda mais caros.
“Pela composição do quadro das políticas fiscal e monetária, a agressividade da taxa de juros é muito grande no consumidor. A possibilidade de ter mais gente inadimplente é muito maior do que a gente tinha no final de agosto, por exemplo”, afirmou Godoi, da Saint Paul.
Segundo dados do Banco Central, a inadimplência total do sistema financeiro estava em 3,2% em julho de 2024. O número representa estabilidade quanto ao mês anterior e uma queda de 0,3 (p.p.) em comparação a julho de 2023.
Taxa Selic: entenda o que é a taxa básica de juros da economia brasileira
Quais efeitos a alta de juros deve ter na economia brasileira?
Ainda de acordo com os especialistas, a expectativa de desaceleração da economia com o aumento de juros também deve ter efeitos mais evidentes em setores específicos — como o comércio, por exemplo —, e pode refletir no mercado de trabalho e na renda das famílias.
Para Mauad, por exemplo, parte do que explica o atual crescimento na atividade brasileira é o avanço dos gastos do governo, que têm um limite.
“O governo não vai poder ficar sustentando o PIB indefinidamente. E quando os gastos públicos diminuírem, a leitura é que, no limite, podemos até mesmo ter um quadro de recessão no país”, afirmou o professor da Fipecafi.
Os juros elevados em um cenário de menor crescimento, nesse caso, também traz a tendência de que as empresas diminuam a produção, que frear ainda mais a economia.
“Pensa como um empresário. Por que você vai produzir mais se o consumo vai cair e os juros estão mais altos? Se você produz menos, a tendência é ter menos turnos de produção, o que pode gerar uma diminuição da renda do trabalhador, um aumento da taxa de desemprego e um risco maior das operações de crédito”, explicou Godoi.
O controle do consumo e o desaquecimento da atividade são ferramentas usadas pelo BC para controlar os preços. O tamanho dessa desaceleração da economia vai depender de fatores como o quadro fiscal brasileiro e a expectativa de inflação futura, além do andamento da economia global.
E há um fator extra: o Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) decidiu cortar as taxas de juros americanas em 0,50 ponto percentual, mais do que o mercado financeiro esperava.
A redução nas taxas americanas deve mexer com o fluxo de dinheiro no mundo todo. E isso pode, inclusive, beneficiar um fluxo maior de capital para o Brasil, melhorando o mercado de ações e também a cotação do dólar.
Parte da inflação brasileira é dolarizada, por conta dos diversos insumos e produtos importados que são consumidos no país. Assim, com um dólar mais barato, a pressão dos preços desses itens cai e tende a reduzir a inflação.
No limite, isso poderia fazer o BC brasileiro subir menos (ou voltar a cortar mais cedo) a taxa de juros que agora aumentou.
g1 > Economia
Comments are closed.