Município tem a maior porcentagem de população que se declara indígena no estado de SP, sendo 15,1% dos moradores da cidade. Dados são do Censo 2022, divulgados pelo IBGE na segunda-feira (7). Reserva de Araribá, que fica em Avaí, completa 109 anos neste ano
Chicão Terena / Arquivo pessoal
A cidade de Avaí, no centro-oeste paulista, é o munícipio com o maior percentual de indígenas em relação à população total, segundo os dados do Censo 2022, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e divulgados na última segunda-feira (7).
Segundo o levantamento, 15,1% da população de Avaí é considerada indígena. São 677 indígenas em uma população de 4.483 pessoas. De acordo com o IBGE, a pessoa indígena é aquela que se autodeclara indígena e pode viver dentro ou fora das terras consideradas indígenas. (Confira abaixo o ranking estadual).
Avaí: 677 indígenas (15,1%);
Arco-Íris: 249 indígenas (12,18%);
Barão de Antonina: 134 indígenas (3,79%);
Braúna: 177 indígenas (3,3%);
São Francisco: 78 indígenas (3%);
Tapiraí: 151 indígenas (1,89%);
Cananéia: 214 indígenas (1,74%);
Iguape: 327 indígenas (1,12%);
Mongaguá: 656 indígenas (1,06%);
Sete Barras: 118 indígenas (0,93%).
Em números absolutos, Avaí é a 5ª cidade com maior número de indígenas do estado, atrás de São Paulo, Guarulhos, São Bernardo do Campo e Itanhaém. Todas cidades com mais de 100 mil habitantes.
Ao g1, moradores indígenas e de outras etnias disseram que a vida em Avaí carrega, além de tranquilidade e sossego na pacata cidade de pouco menos de 5 mil habitantes, a preservação das tradições dos povos originários.
Lá, a maioria dos indígenas vive na reserva de Araribá e são, em grande parte, das etnias Terena e Guarani. Há também alguns representantes dos Kaingang.
Historicamente, a terra-indígena Araribá era povoada pelo grupo tupi-guarani até 1932, quando vieram os primeiros Terena do Mato Grosso do Sul, com o intuito de preservar o território que estava sendo invadido por fazendeiros.
O espaço de cerca 1920,80 hectares ou 793,72 alqueires foi declarado reserva indígena antes mesmo da chegada dos Terenas, em 28 de abril de 1913, após um decreto do Governo de SP. À época, Avaí ainda era Distrito de Jacutinga, município e comarca de Bauru (SP).
A reserva completa 110 anos de fundação em 2023 e, ao todo, é formada por quatro aldeias. São elas:
Aldeia Kopenoty, onde vivem indígenas das etnias Terena e Kaingang
Aldeia Ekeruá, onde vivem indígenas Terena
Aldeia Nimeundaju , onde vivem indígenas da etnia Guarani
Aldeia Tereguá, onde vivem indígenas das etnias Terena e Guarani
No povoado existe uma Unidade Básica de Saúde e também uma escola, vinculada à Diretoria de Ensino de Bauru (SP), através da Secretaria Estadual de Educação, responsável pela contratação dos professores e do corpo docente indígena.
“No dia a dia da nossa escola é sempre ensinado o Terena [idioma] para os mais pequenos, mas isso também já vem da casa dos pais e aqui complementamos a formação”, conta Adão Alves, professor indígena da instituição.
Terena, tereno ou têrenoe (denominação utilizada pelos terena) é uma língua indígena do Brasil falada por cerca de 15 mil indivíduos da etnia Terena e pertencente à família linguística aruaque.
A utilização do terena estende-se principalmente no estado Mato Grosso do Sul, estando também presente em aldeias indígenas localizadas em São Paulo, como a reserva Araribá em Avaí, e no Mato Grosso.
O terena é considerado uma língua ameaçada devido ao baixo número de falantes e perpetuação desigual da língua em diferentes aldeias. Assim, a língua é majoritária em algumas comunidades indígenas e raramente utilizada em outras. A Unesco classifica o terena como definitivamente em risco.
De educação básica à saúde, caciques de aldeias no interior de SP narram desafios para garantia de direitos
Outro risco para a comunidade diz respeito à evasão dos mais jovens. Por isso, a cultura indígena recebe atenção especial na escola que funciona dentro da aldeia. O contato entre os índios jovens e mais velhos é uma das táticas utilizadas para fazer com que a cultura permaneça ativa.
“O desafio para os caciques e lideranças é conseguir ter alternativas para conseguir assegurar os jovens à comunidade. O diferencial de tudo é o convívio da comunidade, já que dificilmente as famílias vão sair das aldeias. Então, quando o jovem sai da aldeia, é para fazer uma faculdade ou por conta de um trabalho”, conta Chicão Terena, liderança indígena e Cacique do povo Terena Aldeia Kopenoti.
Avaí e Arco-íris têm as maiores porcentagens de população indígena no estado de SP
No entanto, a formação de novos talentos e integração da população indígena com o restante da sociedade também faz parte da realidade vívida pelos grupos indígenas em Avaí.
Um desses exemplos é Regiane Kaingang. Nascida e criada na aldeia Kopenoti, a indígena atuava como auxiliar de enfermagem. Para se qualificar na profissão e atuar em prol da comunidade, ela resolveu fazer uma faculdade de enfermagem em Bauru (SP), cidade que fica a 42 quilômetros de distância de Avaí.
“É um motivo de muito orgulho para mim e para minha comunidade. De me formar e voltar para exercer o papel de enfermeira na minha aldeia. Eu saí com esse intuito de aprender e retribuir para o meu povo”, conta a indígena.
O sentimento de preservação dos povos indígenas, seja da cultura ou da existência propriamente dita, é o que motiva os indígenas em Avaí, e é repassado constantemente dentro da escola.
“Aprendemos sobre o passado da nossa cultura, do nosso povo. E devemos resgatar esse passado. O povo está muito ligado na internet e não mais na tradição. A tradição é uma coisa nossa, que deve ser guardada”, relata Victor Hugo, estudante indígena de 15 anos.
Na comunidade em Avaí há uma escola ligada a educação municipal
Chicão Terena / Arquivo pessoal
E para quem não se declara indígena, a cultura dos povos originários inevitavelmente permeia as relações na cidade. É o que garante a professora de português Ana Cristina Mady, de 48 anos.
Identificada como uma mulher branca, ela é natural de Avaí e, embora tenha passado um tempo fora da cidade, retornou e vive nela há 10 anos. Segundo ela, culturalmente e economicamente, a influência da população indígena é visível para os outros moradores da cidade.
“Tem um impacto grande no comércio, isso é inegável. Culturalmente, eles estão sempre presentes em festas pontuais, como o próprio Dia dos Povos Indígenas, 7 de setembro e 1º de dezembro, que é aniversário da cidade, trazem seu artesanato e danças típicas”, revela.
“O que eu acho lindo são as lendas urbanas, como a presença de cemitérios indígenas -u m deles estaria onde é a nossa praça da matriz Major Gasparino de Quadros. Mas certeza mesmo, ninguém tem”, complementa a professora.
Ana Cristina ressalta que, dentro da cidade, a coexistência entre as diferentes culturas tem como alicerce primordial o respeito. “As lideranças indígenas lutam para que não haja a aculturação, no sentido estrito da palavra. Eu acho que o movimento de trazer suas danças e artesanato aproximam, ensinam, impõe respeito. Eu acho que o respeito é importante para qualquer cultura e para manter qualquer cultura”, pontua.
Reserva indígena em Arco-íris é formada por sete etnias
Lidiane Damaceno Cotui Afonso /Arquivo pessoal
📝 Censo do IBGE
O Censo é uma pesquisa realizada pelo IBGE para fazer uma ampla coleta de dados sobre a população brasileira. Ela permite traçar um perfil socioeconômico do país, já que conta os habitantes do território nacional, identifica suas características e revela como vivem os brasileiros.
Todos os 5.568 municípios brasileiros, mais dois distritos (Fernando de Noronha e Distrito Federal), num total de 5.570 localidades, receberam visita de recenseadores. Segundo o IBGE, foram visitados 106,8 milhões de endereços em 8,5 milhões de quilômetros quadrados.
✅ Resultados
O g1 publicou textos com o resultado da pesquisa, que visitou domicílios na região de Bauru e Marília.
A divulgação se dá graças a um sistema desenvolvido pela Globo que transformou em reportagens, de maneira automática, os dados oficiais do IBGE. O conteúdo foi revisado pelos jornalistas do g1.
Confira população atualizada dos municípios das regiões de Bauru e Marília
A tecnologia foi utilizada de maneira pioneira nas eleições de 2020, quando era mostrado o resultado da disputa em cada cidade. Em 2022, o sistema recebeu incrementos. Além de textos, cada reportagem era acompanhada de vídeo com o resultado das eleições por município.
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